João Daniel Jacobina - Crimes eleitorais por Clara Luz / José Marques
Bahia Notícias - Quais os tipos mais comuns de crime eleitoral? Qual a pena aplicada a cada um deles?
João Daniel Jacobina - Existe crime eleitoral e existe ilícito eleitoral. São duas coisas diferentes. A diferença é que o crime eleitoral é processado através de uma ação penal e o ilícito eleitoral é através de uma ação civil. Há procedimentos distintos e consequências diferentes, porque a pena para um crime eleitoral não é feita diretamente através da cassação do mandato. Isso é uma consequência. Já o ilícito eleitoral é aquele que pode cassar o registro do candidato ou o diploma. Pode ser, por exemplo, impugnação ao registro de candidatura, como nas questões de inegibilidades que estão muito na moda por força da Lei da Ficha Limpa. No curso do processo eleitoral que vai de julho a outubro podem ter as representações por captação ilícita de sufrágio, ou seja, é a compra de votos, que é considerado ilícito eleitoral e também é crime. Teoricamente, o sujeito que compra voto pode responder a dois processos: um processo cível eleitoral pelo artigo 41-A e uma ação penal pública pelo Artigo 299. E mais uma coisa: o carro chefe do crime eleitoral é a corrupção eleitoral. Ou seja, a compra de voto. Mas é importante deixar claro que enquanto no ilícito eleitoral, que pode cassar o registro do candidato, mandato ou diploma, só é punido o político que tem mandato, na ação penal que apura o crime de compra de voto, o eleitor que vende o voto também responde a ação penal.
BN - Os candidatos à prefeitura e à Câmara Municipal têm constantemente imputado aos concorrentes a responsabilidade pela destruição de cartazes de campanha. Essa prática é considerada crime eleitoral? Como se pode provar que esse tipo de atuação veio de pessoas contratadas pelos concorrentes?
JDJ - Teoricamente é ilícito eleitoral. A questão é como provar e isso depende dos meios de prova que o direito permite. E quais são esses meios de prova? Testemunhal, documental, como a fotografia, filmagem, gravações. Além disso, depende de uma estrutura por parte da Polícia Federal, do Tribunal Regional Eleitoral (TRE) ou por parte dos próprios partidos políticos que podem de alguma forma se organizar para ter uma estrutura de fiscalização.
BN - E o que isso pode provocar no candidato?
JDJ - Eu particularmente não acredito que isso parta de candidatos. Eu não creio que um candidato a prefeito de Salvador ou a vereador organize situações como essa. O que os candidatos devem se preocupar nesse momento são as situações de abuso de poder econômico que acontecem quando se gasta mais do que a média, quando a máquina pública é utilizada indevidamente em favor de um candidato, com os meios de comunicação e cim compra de votos - que é oferecer vantagens em troca de votos. Essas são as quatro situações que podem conduzir a processos com reflexo direto no mandato.
BN - Existe uma regulação dos cartazes móveis? Por exemplo, em Salvador eles têm que ser retirados depois das 22h. Existe um regulamento de como o candidato deve agir em relação a esse tipo de propaganda eleitoral?
JDJ - A Lei 9.504 tem um capitulo destinada à propaganda eleitoral e lá até as dimensões dos cartazes são previstas. Além da lei já citada, o TSE dita resoluções que disciplinam melhor a matéria. Então, todo o processo eleitoral é regulamentado e nada pode ser feito de qualquer forma.
BN - Se uma propaganda eleitoral usar a foto e o nome de uma pessoa supostamente influente, seja político ou não, e o número de um candidato, sem identificar que a pessoa que está na foto não é o candidato em quem os eleitores vão votar, é crime?
JDJ - Existe um crime no Código Eleitoral que é fornecer o eleitor informação diversa daquela real, ou seja, é fazer uma publicidade veiculando informação falsa e isso de fato é crime.
BN - E em relação a muros pintados sem autorização? Pode ser considerado crime eleitoral?
JDJ - A questão do muro por si só não é crime, mas é ilícito eleitoral. Pode ter como consequência a retirada ou aplicação de multa no âmbito eleitoral. Quando é crime você tem consequências de ordem criminal, como condenação, teoricamente uma pena privativa de liberdade que quase sempre é substituída por pena alternativa.
BN- Como se configura uma boca de urna?
JDJ - Boca de urna é crime. Existe um regulamento para o dia da eleição e é punível, com detenção de seis meses a um ano e pena alternativa de prestação de serviços à comunidade pelo mesmo período, utilizar alto falante, amplificador de som ou promover comício ou carreata. Já que é uma conduta criminosa, a polícia pode prender e levar para a delegacia. Arregimentação de eleitor ou propaganda de boca de urna, além do ilícito eleitoral, é crime a divulgação de qualquer espécie de propaganda de partidos políticos ou de seus candidatos. Ou seja, a boca de urna é a campanha eleitoral no dia da eleição. Entretanto, a lei permite as chamadas manifestações individuais e silenciosas, você pode votar com a bandeira, o broche o adesivo, isso é possível. As cautelas para o dia da eleição são: boca de urna, distribuição de refeição é crime e transporte de eleitor, só quem pode transportar o eleitor é a Justiça Eleitoral.
BN - Mas, efetivamente, a gente sabe que a boca de urna existe e a maioria dos casos fica impune. O que fica de forma mais explícita santinhos são distribuídos no dia da eleição. Então de que forma o eleitor pode denunciar?
JDJ - Por ser crime, qualquer um pode e as autoridades devem prender em flagrante delito. Você cidadão se depara com alguém cometendo um crime, você pode chamar a polícia. A polícia diante da situação conduz a delegacia o sujeito que praticava a boca de urna e depois é encaminhado para a justiça.
BN- Os candidatos a prefeito de Salvador pelos partidos menores, PRTB e PSOL, têm reclamado que, em algumas emissoras de televisão, eles foram alijados do debate. Isso pode ocasionar algum tipo de complicação para a emissora?
JDJ - Teoricamente se for demonstrado que o veículo de comunicação interferiu no equilíbrio da eleição, isso pode ter complicações eleitorais, sim.
BN - Na Bahia, houve diversos casos de brigas entre os diretórios municipais e estadual de partidos para o lançamento de candidaturas. Em alguns lugares, a candidatura foi impugnada, em outros, não. Como se dá esse processo de hierarquia? Os diretórios municipais têm autonomia?
JDJ- Embora haja uma hierarquia interna nos partidos, essa hierarquia não pode ser uma ditadura interna. Se o partido, na forma do estatuto, realiza a convenção e na convenção municipal decide que fulano é o candidato, salvo intervenção interna, o sujeito é candidato. O diretório estadual e nacional pode ter manifestado descontentamento com a candidatura, mas talvez não tenha tomado medidas internas para se tomar uma providência. Há um candidato, ele faz a convenção, bota a convenção de baixo do braço e vai para a Justiça Eleitoral e pede o registro. O que a Justiça Eleitoral faz? Ele preenche os requisitos? Foi indicado pela convenção? A convenção é válida? Acabou. Não basta só a opinião do Diretório Estadual, tem que tomar medidas efetivas para desconstituir a convenção que é um ato jurídico válido. Não importa para onde foi o dinheiro, o que importa é que o dinheiro público foi usado para a finalidade não pública. É chamado de Peculato-desvio. Significa dá a verba pública destinação diversa prevista em lei,quando se desvia o dinheiro público, com proveito pessoal ou proveito de terceiro.
BN - Mudando para o assunto que está na pauta nacional, em relação ao julgamento do mensalão, boa parte da defesa tem tentado dizer que os réus não cometeram o crime de compra de apoio de voto, mas que houve o crime de caixa 2. De que forma você típifica o crime de caixa 2?
JDJ- A rigor, não há um tipo penal de caixa 2 enquanto crime, mas como ilícito eleitoral existe. Como crime pode ocorrer outras consequências como, por exemplo, uma falsidade ideológica. Na prestação de contas o candidato faz constar uma informação indevida, se ele gastou 10x e declarar x, ele esta falseando a verdade de um documento público. Então o caixa 2 como um crime por si mesmo não é, é ilícito eleitoral.
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